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Lisboa

A ocupação humana de Lisboa, durante a Idade do Ferro, parece, até ao momento, circunscrever-se à colina onde se implanta o Castelo de S. Jorge. Escavações recentes, tanto no seu topo, ocupado pelo castelo medieval, como na plataforma da Sé, e ainda no sopé, revelaram vestígios arqueológicos dessa época.
O chamado morro do Castelo estava limitado, a Sul e a Ocidente, pelo rio Tejo e pelos vestígios do braço desse mesmo rio que, na época, já seria, só apenas, uma área parcialmente inundada. Deve referir-se ainda que a existência de uma praia foi verificada durante as escavações na rua Augusta, tendo ficado aparentemente claro que o complexo fabril romano tinha sido construído sobre um areal. A Oriente, corria uma linha de água, a actual rua da Regueira.
A colina do Castelo possui, pois, uma situação topográfica e uma morfologia próprias que revelam condições privilegiadas para a implantação humana, dado o sítio deter também ampla visibilidade e considerável defensabilidade. 
As pequenas e dispersas areas escavadas pouco ou nada revelaram sobre a planimetria e a arquitectura pré-romana de Lisboa.
Somente as estruturas do BCP na Rua Augusta permitem caracterizar vagamente o edificado pré-romano.
A ocupação sidérica da colina do Castelo apresenta uma considerável diacronia.
Se é certo que a grande maioria do espólio recolhido durante as escavções do Claustro da Sé catedral apresenta características formais e tecnológicas que permitem enquadrá-lo em meados do século VI a.C., alguns outros elementos recolhidos na rua Augusta possibilitam admitir que a ocupação sidérica prosseguiu durante os século V e IV a.C.

O topónimo pré-romano, que os autores clássicos consagraram e que muita epigrafia romana deixou registado, deixa antever uma ligação linguística à área meridional da Península Ibérica. De facto, o sufixo -ipo, patente em Olisipo, aponta para uma origem mediterrânea que descarta uma qualquer filiação centro-europeia.
A ligação da actual cidade de Lisboa ao Sul peninsular durante a época pré-romana, que a paleolinguística deixa antever, é também confirmada pelos muitos achados arqueológicos que as intervenções preventivas e de salvamento, levados a cabo na área urbana, têm vindo a proporcionar. 

Os trabalhos levados a efeito no Claustro da Sé permitiram escavar, sob sapatas de muros romanos datados do século I d.C., cerca de 1.50 m de terras, correspondentes a vários níveis arqueológicos, cujos materiais pertencem, indubitavelmente, a uma Idade do Ferro Orientalizante. Infelizmente, "...atendendo à natureza e bom estado de conservação das estruturas que se desenvolvem sobre o contexto orientalizante e à grande altura dos aterros, não foi ainda oportuno proceder-se ao alargamento da escavação deste contexto" (Amaro, 1993). Assim, os materiais recuperados na Sé de Lisboa, pertencentes à Idade do Ferro, são, quase na totalidade, provenientes de uma estreita sondagem (1.5 x 1 m), que por razões de segurança não atingiu a rocha de base (ibid.).
Na rua Augusta, as estruturas visíveis são rectangulares e constituídas por muros de pedras de pequenas e médias dimensões ligadas por argila. Estas paredes, de pequena altura, são, quase seguramente, o embasamento de uma construção que seria construída com adobes de que parece ter-se recolhido evidências. Os dois edifícios têm, no seu interior, pequenas estruturas circulares, compostas por seixos rolados, com evidentes sinais de terem sido submetidos a altas temperaturas. Este facto, associado à forma circular, indica que se está em presença de estruturas de combustão.
As escavações arqueológicas preventivas que se estão a realizar no Castelo de S. Jorge possibilitaram a recolha de numeroso espólio da Idade do Ferro, que engloba um importante conjunto de cerâmicas orientalizantes, nomeadamente de engobe vermelho, e pintadas em bandas polícromas. Infelizmente, nada se conhece nem sobre os materiais nem sobre o contexto.
Os materiais recuperados no Claustro da Sé são quase exclusivamente constituídos por cerâmicas. Algumas escórias de ferro e fragmentos incaracterísticos de cobre e bronze constituem a excepção .
Quanto à cerâmica, deve dizer-se que ela é, praticamente na totalidade, fabricada ao torno. Entre as várias dezenas de milhar de fragmentos, apenas se contam uns escassos dez de fabrico manual.  Algumas das cerâmicas sidéricas recolhidas durante as escavações da Sé foram sumariamente publicadas em 1993 . Nesse trabalho, ficava confirmado, em absoluto, o carácter orientalizante de que se revestia a ocupação proto-histórica de Lisboa, carácter esse que as recolhas de Vergílio Correia já deixavam antever (Cardoso e Carreira, 1993).      
A cerâmica a torno engloba ânforas, cerâmica cinzenta, cerâmica de engobe vermelho (pratos e taças), cerâmica pintada em bandas (pithoi e urnas tipo Cruz del Negro) e um conjunto de formas (pratos, taças, vasos de armazenamento de tipo pithos) cujas superfícies não foram alvo de qualquer tratamento particular (sem engobes ou pintura).
O estudo que o Prof. João Luís Cardoso realizou sobre a fauna recolhida nas escavações da Sé de Lisboa, nos contextos em que os materiais orientalizantes foram recuperados, forneceu elementos de grande importância
Os fragmentos ósseos e dentários incluíam:
126 pertencentes a ovicaprinos;
53 a Bos taurus;
1 a Bos auroque;
45 a Sus, 6 dos quais correspondem a javalis e 13 são domésticos;
8 a cervus;
8 a Oryctolagus cuniculus;
1 a Canis familiaris;
1 a cão ou gato;
3 a carnívoros indiferenciados (gato ou raposa);
11 a aves.

Verifica-se, portanto, que dominam os ovicaprinos, que representam 49.03% do total da amostra, seguidos de perto pelo Bos taurus, com 20.62%. Os suínos são também importantes no conjunto, 17.51%, sendo as outras espécies quase irrelevantes no seu contributo para a dieta alimentar ao nível das proteínas animais. Deve, no entanto,ainda destacar-se, pela quantidade de carne que disponibilizaram, os 3.11% dos cervus identificados. Pelo contrário, os 3.11% de coelho e os 4.28% de aves podem considerar-se irrelevantes em termos proteicos, o mesmo sucedendo às calorias proporcionadas pelo cão, gato e/raposa, isto no caso de eles terem sido efectivamente comidos, o que não é absolutamente seguro.
Estes dados permitem também verificar que o contributo que a caça forneceu para a dieta alimentar não é significativo, sendo claramente dominantes os animais domésticos, tanto em número como em quantidade de carne fornecida (20.62% de bos 
taurus, 49.03% de ovicaprinos e mesmo grande parte dos suínos). A prática cinegética não ocupava, de forma significativa, a população de Olisipo.